2016/05/31

Dia 2269

Quando me dei conta não escrevia mais as mesmas coisas. Não falava mais as mesmas coisas. Não fazia mais as mesmas coisas. Com o tempo vamos largando algumas coisas para começar a viver de verdade. No meu caso, foi a arma e o copo. 
Talvez não seja sobre o final feliz, talvez seja sobre a história mesmo. Foi nessa hora que comecei a pensar, que se eu podia beijar os lábios doces dela porque iria querer sentir o amargo do scotch? Menina frágil, de coração mole. Personalidade forte, sentimentos confusos. Medo constante. Cheia de segredos, guardados no mais profundo de si mesma, mas que ela queria dizer a alguém. Alguém esse que não a julgasse, que os guardasse e que se interessasse por seus segredos, que se interessasse por quem ela era. E nunca, jamais, pelo que ela poderia oferecer.
Nesse dia a levei para uma ponte - sempre tem uma ponte. Pedi pra que ela ficasse imóvel porque sabia que ela tentaria me segurar. Quando ela se deu conta, eu tinha ultrapassado a grade de segurança. Ela me chamou de louco, fez cara de espanto. Começou a elevar o tom de voz pedindo pra eu sair de lá. E quanto mais ela falava, mais para o parapeito eu ia. Eu fiquei com a ponta dos meus pés em cima dos carros lá embaixo. Pedi pra ela subir lá comigo, ela ficou apavorada e cheia de medo. Começou a gritar e chamar pelo meu nome. Os olhos bem abertos começaram então a encher de lágrimas. 
- VOCÊ NÃO TEM CORAGEM NEM DE SUBIR AQUI, COMO VAI TER CORAGEM DE VIVER A VIDA? Não to pedindo pra você se matar, to pedindo pra você vencer teu medo e se arriscar. Viver não é suicídio, mas é um risco que a gente corre todo dia quando levanta da droga da cama todas as manhãs. Acha que eu não quis correr, ir embora? Eu quis correr e correr, correr até sentir meus pulmões doerem. Mas eu não o fiz. Acha mesmo que não tive vontade de puxar aquele gatilho? Mas eu não o fiz. Quando implorei, supliquei a Deus coragem para fazê-lo Ele me mandou você. Eu não tinha mais forças, é sério. Estava esgotado. Mas tive coragem para arriscar e nem o seu nome completo eu sabia.
Eu sei que ela sentiu vontade de me deixar ali e virar as costas. Deu pra ver que ela também queria chorar. Mas não fez nada disso. Parecia que ela tinha absorvido. Eu desci de lá de cima. Abracei-a, ela me abraçou de volta. Inspira, expira. Conte-me todas as tuas dúvidas. Toda a gente sangra assim, da mesma forma. Inspire, expire. Avance e volta atrás. Se todos forem embora, eu ficarei. Empurramos e puxamos. E eu caio ás vezes. Mas não vou largar, porque você segura a outra ponta.
E há uma luz nos teus olhos, nos teus olhos garota. 

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