2016/03/29

Dia 2230


Eu havia parado o carro em algum lugar próximo á saída 39 da Fernão Dias. A última placa que vi já avisava que eu tinha saído de São Paulo/SP. Era fim de tarde, o sol amarelava a pista. Não haviam tantos outros na estrada, passava um a cada 3, 4 minutos. Eu deixei o rádio baixo tocando qualquer música aleatória enquanto a luz sunset invadia pelo painel. Fiquei pensando ali se deveria acabar com a minha vida em uma roleta russa com o .38 que estava no porta luvas. Ou se deveria acelerar o velho carro o máximo que conseguisse e puxar o freio de mão ao virar o volante para ver o mundo girar. 
É que esses fins de tarde bonitos assim são tão cruéis. Principalmente aqui nessa rodovia. Ou são as lembranças daqui quando estava no banco do passageiro e olhei para o lado. Isso tudo mata mais que uma arma ou a probabilidade do acidente. Nada é como Scar Tissue do Red Hot sabe? Não estou parado aqui para tocar um lindo solo de guitarra.
Acho que morri uma centena de vezes só no último mês. Mas eu ainda estou aqui. Eu ainda estou. E foi o fim do mundo pra mim alguns dias atrás, mas acordei no dia seguinte. É o tipo de inferno que você tem que passar para se renovar. Nessas horas as pessoas te encontram na rua e falam "Nossa, como você mudou." e não foi a barba que cresceu ou o corte de cabelo que mudou. Foi do lado de dentro cara, foi sua alma que cresceu e ficou mais forte. 
É bonito de se ver alguém de alma limpa, sem maiores pesos de vidas passadas pra carregar. Sem tristezas para se lamentar. A pessoa ri e você sorri de volta. Simples assim. Uma hora o fim do mundo acaba e quando acabar não vai parecer o fim, vai ser mais um começo na verdade. Ou recomeço.
Pisei na embreagem, engatei a primeira e fui saindo devagar. Aumentei mais o som e abri as janelas. Era Californication que tocava na hora e só conseguia cantar as partes "Esta é a margem do mundo" e "Case comigo garota seja uma fada para o meu mundo, seja a minha própria constelação." Aumentei a marcha, aumentei a velocidade, aumentei o tom ao cantar. Me senti vivo, finalmente. E a estrada me engolia um pouco a cada quilômetro mas eu não ligava. Que me tragam enfim, o horizonte. 

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