2014/07/29

Dia 1928

Uma mulher que cheira a cigarro não é tão sexy quanto uma que cheira a banho recém tomado. As que cheiram a cigarro que me desculpem mas, não tem nada mais sensual do que aquele cheirinho de banho na cama do nosso lado. Você sabe que a pele ainda esta com aquele frescor da água que alisou cada centímetro quadrado por 10, 20 minutos.
Não é só a calcinha nova de renda que faz o diferencial, o aroma da pele da toda a vibe entende? O jeito que ela usa as mãos ao me tocar, o modo como beija os meus lábios. Como ela faz presença e participa, não tornando aquilo uma monotonia. É dar e receber, não apenas ficar ali esperando que um mundo de coisas aconteça em uma cama de um quarto de motel barato.
E então ela vai sentir a minha barba deslisar seu pescoço devagar fazendo aqueles micro segundos evoluírem e subtraírem as sensações causando o arrepio repentino dos pelinhos finos de seu braço. Eu adoro esses detalhezinhos, pode crer.
Minhas mãos? Não, meus dedos... Penetrando solenemente entre os cabelos perto da nuca e segurando firme. Em um movimento retroativo, fazendo a cabeça inclinar e deixar absolutamente o queixo exposto. E essa é minha deixa, pra sussurrar algo no ouvido e fazê-la imaginar que tipo de absurdos aconteceriam naquela cama em um sábado á tarde. 
E nesses nossos encontros e desencontros ela esta assim, com esse cheiro de banho recém tomado. E todas vocês que me desculpem, mas isso me excita. Não há nada mais sexy que isso em uma mulher. Saber que ela esta pronta pra você, te esperando e deixando a porta do apartamento aberta pra que você entre, na casa dela, na vida dela... Nela. No corpo dela, na alma dela e principalmente em seu coração.
Porque ficar dentro do coração de uma mulher não é como um gozo rápido. Esta mais para orgasmos múltiplos. Talvez seja essa a definição de amor: Gostar do mesmo cheiro de banho recém tomado todas as noites. Até o fim. 
Bem, ela desligou o chuveiro e eu já estou deitado na cama. Boa noite.

Dia 1927

Existem dois "eu's". O 'eu' da vida real e o 'eu' que escreve. Quem dera eu ser a mesma pessoa. Quem dera 'eu', na vida real, dizer tudo que digo escrevendo sem ser preso, sem apanhar ou receber olhares atravessados. Quem dera eu ser livre pela manha e o vento acariciando meu rosto tanto quanto as linhas sendo acariciadas pela tinta da minha caneta. 
Eles, jamais souberam o que é liberdade.

2014/07/28

Dia 1926

E bem no fim da festa, em meio aqueles drinks perguntaram pra gente porque estavamos juntos. 
Nos olhamos e rimos. Não sabiamos como responder.
Não há um só porque. Não saberia dizer. Eu só sei que tinhamos feito um acordo secreto. Tipo um pacto. Era eu e ela contra o mundo. Nos tornamos guardadores de segredos e jamais saberiam o que nós dois sabiamos. Eu sobre ela e vice-versa.
Eu sei que ela se lembra daquelas tardes de sabado ouvindo Oriente no quarto dela. Dos desastres na cozinha. Dos encontros e desencontros debaixo das cobertas. 
Ela é tão colorida e eu tão preto e branco. Sou marrento e ela pentelha demais, mas é desse jeito mesmo que a gente faz. Ela curte mais um leite com chocolate eu já sou mais do café. Mas se eu faço ciume de propósito ela me bate.
A quem interessar, ela esta na praia curtindo o mar. E o mar sou eu... Grande o suficiente pra envolvê-la por inteiro. Sem medo. De peito aberto e alma livre a gente vai por ai.
Se me perguntar, ontem ela estava deitada nua na minha cama me olhando daquele jeito. Daquele jeito. E a gente olha e ri. Porque não sabemos explicar mas sabemos. Sabemos muito bem. Somos eu e ela, contra o mundo.

Dia 1925


São Paulo, 25 de julho de 2014.
Uma vez me disseram que aqui era grande demais, perigoso demais. Bem, agora eu concordo com você. Outra pessoa me disse não faz muito tempo que eu também não saberia viver em cidade pequena, do interior por exemplo. Apesar de eu gostar da calmaria, a tranquilidade e silêncio esta mais para uma quebra de rotina do que para um cotidiano sequencial. É, eu tenho que concordar com você também. Eu sou o cara que adora a Av. Paulista e os bares da minha Augusta. 
Conheço cada beco escuro e fedido dessa cidade. Das favelas da zona leste até os cantos escuros de Pirituba. Cada pico dessa porcaria de cidade tem uma história pra contar seja por acaso, coincidência ou destino eu estive lá. Não estamos salvos aqui e em lugar nenhum. A merda acontece em todo lugar amigo, em toda cidade.
Ultimamente ando pensando por três. Por mim, minha mulher e meu filho. Minha filha nasceu e
minha mulher chorou. Mas eu estava armado dentro da sala de parto e fiquei pensando em que tipo de proteção eu tinha que dar para aquele serzinho totalmente dependente de mim e da mãe dele naquele momento. Ninguém encosta neles entende? Eu não deixo. Minha mulher e minha filha são os intocaveis. 
E naquele mesmo dia...
Vectra preto. Placa NQC 5236. Voltava pra casa sozinho naquela noite. Ainda bem. Abarroaram meu carro e eu acelerei. Acabei batendo em outro na minha frente. Sairam pela porta da frente atirando. Eu me abaixei mas não pude evitar ser baleado. Eles entraram de volta e fugiram. E eu fiquei ali, sangrando. Com uma bala de 9mm dentro de mim. E eu só pensava na minha flha e na minha mulher. De uma forma estranha quando acordei no radio do hospital tocava Pink Floyd - Wish You Were Here. Eu só queria saber onde estavam minha mulher e meu filho. No celular do lado da cama uma mensagem não lida. Dizia "E se eu não chegar a tempo, mando meu coração para você pra ajudar o seu a continuar batendo."

São Paulo, 28 de julho de 2014.
Estou em uma cama de hospital segurando um pequeno ser de 4 quilos e 800g no meu colo e a minha mulher me olha sorrindo na cadeira ao lado. Fico feliz de ainda estar de pé pra mais uma. O médico disse que vou estar bom em seis semanas. Minha pequena é linda, tem os olhos da mãe e já sorri pro paizão. Olhando pra elas duas eu me sinto em paz... Como... Como... Como se o mundo todo fosse bom realmente. Teria motivo maior pra continuar lutando? É claro que não. 
Quando você encontra um motivo que valeria a pena morrer, você fica com ele. E pra mim, elas são meus motivos. Amém!

2014/07/26

Dia 1924

Eu vivo em um quarto pequeno e alugado perto do centro da cidade agora. Lá tenho tudo que preciso. É bem pequeno mas prefiro assim, afinal do que adiantaria ter uma casa enorme e vazia?
De vez em quando gosto de ficar sentado na escadaria da igreja vendo os pombos e as pessoas. Quando chega o fim do dia, o sol se esconde atrás dos prédios e aparecem as estrelas em cima da coluna onde tem um enorme sino. É engraçado ver todo esse cenário mudar rápido. Dia. Noite. E os sinos dobram. 
A vida é um relâmpago na linha de tempo do mundo. Eu procuro, evoluo e luto sobre o vento que vem da próxima estação. Dos dias que ainda virão quem manda é o coração. Comprimento o motorista e também o cobrador. Eu chego e falo palavrão, vivo me metendo em confusão mas nunca quero perder esse tesão pela vida que me satisfaz. O mundo se transforma pra nunca perder a magia e quero me manter em plena alegria. 
A diferença entre eu e o resto do mundo é básica.
Você precisa ser feliz pra viver, eu não.

Dia 1923

É claro que vou conhecer novas pessoas e você irá continuar sentindo esse medo estúpido de que eu vá me apaixonar por alguma piada sem graça, sorriso ou brilho dos olhos dessas pessoas, mas eu te garanto que isso não vai ser possível, porque vou estar ocupado demais prestando atenção nas tuas piadas, no teu sorriso e no brilho dos teus olhos.
Você é a pessoa mais incrível desse mundo, eu não seria tão imbecil a ponto de te substituir. O meu céu tem cheiro do seu cabelo molhado. Meu universo cabe dentro dos seus olhos. E meu paraíso encontro nos lábios teus. 
Eu te amo. Fim. The end. Fim.

Dia 1922

Vê se esquece, recomeça, a gente merece. Te amo porra!

2014/07/22

Dia 1921

Sou como todo mundo. Eu levanto cedo com o barulho irritante do despertador que eu mesmo programei. Lavo o rosto, escovo os dentes. Preparo meu café, troco de roupa, amarro meus sapatos e vou pra rua viver. Ou tentar viver. O que seria viver? 
Eu tenho tido alguns problemas pra dormir sabe? Mas não é por insônia ou algo do tipo. É porque eu fico pensando demais. Acho que isso acontece com todo mundo também. Com todo mundo que pensa demais, a gente acaba esquecendo que tem que dormir e quando vai ver já é quase hora de levantar de novo. Dai você levanta cedo. Lava o rosto, escova os dentes. Prepara o café, troca de roupa, amarra os sapatos e vai pra rua. Viver. Viver? Vai pra rua pensando no tempo que deveria ter dormido e não dormiu. Nos pensamentos que ocuparam o horário de sono. No ar da rua que esta mais frio. Na água da planta que esqueceu de regar. Na conta de telefone que ficou em cima da mesa e esqueceu de pagar. Da xícara de café que ficou em cima da escrivaninha e o controle remoto da televisão dentro da fruteira. Eu devo ter esquecido as chaves em algum outro lugar também. Que dia é hoje?
Entao eu me sentei naquela cadeira e cruzei as pernas. Tirei meus oculos redondos e escuros e os coloquei sobre a mesa. Eu conseguia ver as pessoas de onde estava. Tinha um amplo cenário da rua. Coloquei também meu livro recém-começado ao lado do óculos. Logo, uma boa e gentil senhorita me trouxe o café. Há açucar, adoçante e guardanapos em um suporte na mesa. Um 'muito obrigado' e um sorriso eu falo á ela e ela me devolve apenas o sorriso. 
Eu usava um jeans escuro e uma camisa azul. Tenho que admitir que não fazia a barba á alguns meses já. Senti vontade de escrever mas não sabia sobre o que. Sentia vontade de conversar mas não sabia sobre o que. Senti também, vontade de tirar uma fotografia mas não sabia sobre o que. Estava acontecendo ali uma utopia dentro do meu espirito e eu não minha ignorância tremenda nem me dei conta de tal acontecimento. Da pra notar como somos tão tolos á acreditar que sabemos tudo que está acontecendo principalmente no nosso interior. 
Essa ânsia aguda de sempre querer algo maior mas sem saber o que, é isso que se torna tão flageloso no cotidiano e na rotina chata que ao menos uma vez na vida percebemos ter. Por isso, cada vez mais as pessoas se encontram nos livros e nas novelas por ai, tentando fugir da triste realidade que nada emocionante realmente acontece na vida. A repetição diária é o câncer da atualidade. O dia de hoje se torna o dia de amanhã e nenhuma expectativa aparece para um futuro iminente. A ansiedade se torna frequente pois realmente há esperança de que tudo mude. Que talvez, cenas de filmes aconteçam nas nossas vidas. Que sejamos resgatados por agentes secretos ou que dançaremos como em Dirting Dancing. Mas a realidade é que quase sempre estamos hipnotizados atrás de telas de computador tentando sobreviver á mais um dia. E á mais um dia sobreviveremos. Pagaremos nossas contas. Declararemos nossos impostos. Vamos fazer mais uma recarga no celular. Vamos mais uma vez pegar filas nos bancos.
Amanhã talvez seja dia do seu curso de inglês. Vai ser a maior emoção da sua semana agitada. Ou então um novo cliente entrou na loja, corra para empurrar a nova coleção. Dai você toma mais um energético, fuma mais um cigarro. Mas no fim do dia você esta sempre lá diante da maravilhosa tv enorme trocando de canais porque nada, absolutamente te interessa em lugar nenhum. Quer saber porque? Porque você quer mais e não sabe sobre o que.
Então vamos levar isso para outro nível.  
Não precisa escolher muito, algumas estações do rádio e pronto. A música perfeita dentro do carro. Cante com ela. No farol, o sorriso pra garota do Honda prateado. Em casa o que você deve fazer? Lavar o rosto, escovar os dentes. Preparar o café.  
Amanha quando você acordar, você não vai se lembrar de absolutamente nada durante 3 segundos, serão os melhores 3 segundos da sua vida. Ou seria como em Stairway To Heaven e o semblante no rosto é do nirvana que finalmente alcançamos? Mas prefiro ser Kashmir e estrelas preenchendo meus sonhos sendo eu um viajante de ambos tempo e espaço para estar onde eu estive.
Eu sei que com o tempo vou acabar parando de escrever. Vou parar de reclamar tanto e de tentar encontrar no reflexo do espelho a resposta da pergunta: E então, o que temos pra hoje?
Sei que... Sei que toda manhã eu vou lavar o rosto, escovar os dentes. Preparar meu café, trocar de roupa, amarrar meus sapatos e vou para a rua viver. Ou tentar viver. O que seria viver? 
O que vão dizer de bom sobre mim quando eu morrer?
"E não é que aquele filha-da-puta escrevia bem pra caralho?"

2014/07/21

Dia 1920

Ok, eu falo, eu falo... O real motivo pelo qual decidi escolher você.
Pra começar, pela primeira vez eu sei o que eu quero fazer da minha vida. E não são balas ou um cano prateado que vai dar segurança para minha familia, sou eu. Mas por trás dessa segurança toda eu preciso me manter seguro. E você mantém o equilibrio estável do meu humor, da minha paixão, sobre me manter sóbrio nessa vida insana que vivemos. A importância de você ser da onde vem a minha força. Posso fazer qualquer coisa quando sinto meu coração seguro. E você faz um ótimo trabalho nisso.
Não escolhi você apenas por que você fica linda subindo na minha garupa ou porque você é uma mulher extremamente sexy. Isso é um bônus apenas. Ou por que você esqueceu - e ainda tenta esquecer - todos os meus pecados. 
Escolhi você porque você entende toda a minha vida de ponta a ponta. Porque você me salva de todos meus demônios. Porque você mesmo sabendo que eu estou na lista negra de um monte de gente você confia em mim para sua proteção. Escolhi você porque até agora você me ajudou a escrever juntos risos e choros e meu coração agradece por isso. Escolhi você porque você sabe toda a minha rabugice e toda minhas manias (que não são poucas). Escolhi você porque você é minha luz e você vai saber o que eu quero dizer. Escolhi você porque a gente sempre sabe quem gosta da gente porque é a primeira pessoa a aparecer no hospital quando estamos lá.
Escolhi você por acima de tudo eu preciso de você e eu amo você. Além de saber sobre a sua pálpebra que muda quando você mente. Ou o formato da covinha lateral da boca como se mexe quando sorri. Saber a piada instantânea que vem na cabeça quando surge um assunto que sabe que vai fazê-la dar risada. 
E, acima de tudo o silêncio de nós dois que diz tanto, tantos segredos nossos que unicamente eu e você saberemos pra todo sempre.
As pessoas falam demais. Tem muito barulho toda hora. Hoje em dia, pra mim... Amor é ficar em silêncio com outra pessoa e isso bastar.

2014/07/17

Dia 1919

Eu realmente tenho que dizer que... Eu não me importo.
É, eu não me importo. Mas, deveria?
Não sou nenhum sociopata da classe média atual, tão menos um anti social de carteirinha. Eu só não me importo mesmo. Não me importo. Quer que eu repita? N-Ã-O M-E I-M-P-O-R-T-O. E você também não deveria se importar. Já tem muita gente se importando. Pra que se importar mais? Pra que se importar tanto? HAHAHA, eu não me importo. Não é engraçado isso? Estava me importando cada vez menos e agora, só não me importa mais. Nada, nadinha. Sem nenhuma importância. Zero. Juro pra você, não me importo. 
Em uma cervejada com os amigos eu disse "Eu não me importo" e todos eles me olharam assustados. E eu disse "Que foi? Eu não me importo mesmo" - rimos todos. Eles rindo por não acreditar e eu rindo por acreditar demais que... Eu não me importo. 
Quando deixei de me importar fiquei mais leve, mais sereno. Vi a vida com mais presença e foi só não me importar mais que ganhei peso, meu rosto ficou mais corado, meus cabelos pararam de cair e eu tive todas as noites de sono de volta pra mim. Eu olhava pro meu cachorro e pensava nele me dizendo "Cara, você não deveria se importar tanto". E aconteceu. Deixei de me importar. Escrevendo esse texto eu ja tinha parado de me importar. Ao tomar meu café da manhã hoje cedo também já não me importava mais. Ao ir trabalhar hoje e o dia todo, não me importava mais. 
No finalizar desse texto com o ponto final vou continuar não me importando. Vou sair do trabalho, pegar o coletivo e voltar pra casa sem me importar. Na sequência vou tomar meu banho e me deliciar de uma bela macarronada e adivinha só? Sem me importar!
Não se importar é libertador, todos deveriam fazê-lo. Ao menos uma vez na vida com alguma coisa. Ou alguém quem sabe. Tenho certeza que vocês estão entendendo o que eu quero dizer. E se não estão entendendo, tanto faz. Eu não me importo mesmo.

Dia 1918

Prefiro ser julgado por 7 do que ser carregado por 6.

Dia 1917

Eu só queria que ela soubesse que quando eu falo "eu te amo" ela não precisa dizer nada, só sorrir pra mim que eu ja vou saber de tudo.

Dia 1916


Nos pequenos detalhes ou nos grandes desastres afetivos descobrimos quem são realmente, as pessoas. Muitas não agem de acordo com a função que ocupam, seja em se tratando de cargo ou no lugar que conquistaram dentro da gente como "pessoas estimadas". Ouvi duas historias nos ultimos dias. A conclusão a que cheguei é que tem um monte de bruxa travestida com o "véu da santidade" e que os "amigos da onça" não estão em extinção.

O que seria da nossa vida sem os desafios? Já imaginou aquela rotina perfeita, sem nenhum chato para implicar, para fazer a gente valorizar pai e mãe, educação, respeito, os amigos de verdade? A perfeição é utopia dos apaixonados - que sofrem por tabela. Não tem jeito. Tem gente que vê a vida colorida. Outros em preto e branco. Depende de cada um. E a gente sabe que pode colorir a vida como quiser, embora nem sempre pareça fácil abrir as latas de tinta.
Um padre contou que na época do seminário, por não ter dado banho no cachorro da madre superiora foi detonado por ela no refeitório: "Você não serve para ser padre! Aliás, não serve para nada", disse ela, deixando escorrer pelo ralo tudo o que deveria pôr em prática. O jovem quase desistiu da vocação. Palavras machucam demais e podem ficar ali, intactas, ecoando a vida inteira. Mas no meio de bruxas também há anjos. E foi assim que um destes emissários de Deus apareceu e acendeu a luz da esperança, do amor e da boa vontade. E o homem se tornou padre.

Na outra história, uma funcionária pública tinha uma amiga no trabalho - bem, ela achava que era amiga, mas era daquelas, da onça. Incentivou-a na carreira e a amiga da onça virou sua chefe. Tomavam café juntas todo dia, naquela cumplicidade de quem convive e se gosta. Mas, numa destas mudanças, a funcionária foi transferida de setor e achava que a "da onça" poderia intervir. Mas não o fez. E aí uma convivência de anos também foi para o ralo da inconformidade, abrindo um buraco de ingratidão no peito remendado com o piche da mágoa.

E mágoa é um negócio sólido. Fica ali como pedra no rim. Dói. Tem que tirar, expelir, dar um jeito. Ninguém quer ficar com um "corpo estranho" dentro, com algo que não deveria estar ali. Mágoa tem que ir para o ralo também. Tem que escorrer, sem direito de ficar resquício. Demora um pouco, mas a gente supera.
O mundo está cheio de ingratidão, de gente que não sabe agradecer e nem reconhecer. Mas, em contrapartida, também esta cheio de gente grata, de gente do bem, de amigos que não são da onça. Não dê voz ao desalento. Ecoe esperança. Dentro de si. E para os outros.


2014/07/15

Dia 1915

Começou logo de manhã. Eu levantei e fui urinar. Olhei pro espelho e perguntei pra mim mesmo "Quem é esse estranho que veste meu pijama?"
Não sou do tipo que faz incentivo moral ou escreve alguma coisa motivacional no seu whatsapp entende? Mas quando vejo alguém fazendo merda da vontade de dar uns sacodes e falar "Porra meu, você pode ser mais que isso que você anda sendo quando acorda". Acho que eu sempre quis que as pessoas que passam por mim fossem aquilo que eu nunca fui ou que, jamais serei. Alguém bem maior sabe? Mas quem sou eu pra motivar alguém, minha vida é uma droga. Sempre fiz coisas que não queria pra agradar gente que eu nem conhecia em troca de algumas folhas de papel. Folhas estas que em teoria trariam a felicidade pra mim e pra você também. Só que infelizmente não.
Felicidade pra mim é pegar o avião e descobrir um outro mundo. Sair de ônibus sem destino e parar nos pontos finais para um café. É ouvir o silêncio - sabe como isso é raro? - em um lugar calmo. 
Então pare...
Respira calmamente. Inspire. Feche os olhos. Tente manter a paz. Se desligar do exterior. Não é nenhum tipo de meditação é só... Uma maneira de se manter calmo entende? Você realmente vê o que você olha ou só passa os olhos de uma maneira estratégica para manter seu ponto de foco já em outra coisa? Quando você toca algo com suas mãos, você realmente se da conta do tato ou apenas desapercebe mais uma vez aquele instante do toque? Você consegue sentir as saliências de um corpo feminino ao toca-lo ou apenas sacia seu enorme tesão tentando chegar ao apice com seu libido? Você realmente beija os lábios de outra pessoa ou é só uma maneira de sentir-se mais atraido? 
Você, assim como eu também fica contando os ultimos minutos que marca no relógio para sair do seu trabalho. Por mais que você goste do que faz - o que é bem perturbador hoje em dia ja que quase ninguém esta satisfeito onde trabalha - você tende a olhar os ultimos minutos. Essa ansiedade por algo a mais é quase tão pertinente quanto um machucado no canto da boca que sararia se você parasse de passar a lingua nele. 
Então, o que posso fazer pra melhorar? Comprar uma bicicleta e ir trabalhar todos os dias com ela? Plantar uma mudinha na janela do apartamento talvez? Adotar um beagle órfão? Pegar um dos gatos do casarão abandonado da esquina?

É insano pensar, que neste mesmo segundo alguem está morrendo. Algum homem está traindo a sua mulher. Alguém está escrevendo uma carta de suicídio. Alguém perdeu um filho. Alguém foi diagnosticado com câncer. Alguém se envolveu em um acidente de carro. Alguma mulher está grávida. Alguém fumou pela primeira vez. Alguém foi estuprado. Alguém não fala com o pai há anos. Alguém está abusando de seu cônjuge. Alguém está assinando papéis de divórcio. Alguém está se matando. Bem agora. Em cada segundo. Tudo isso está acontecendo lá fora no mundo todo.
O mundo não vai acabar.
A gasolina ainda vai subir. Você ainda vai ter uma ou duas decepções amorosas. As pessoas vão continuar a mentir. Ainda vai ter muita gente tentando te passar a perna. Ainda vai ter muito transito. Ainda vai ter muita fila. Você vai ter que tirar muitas cópias de documentos por ai. Vai haver muitos cafezinhos nos intervalos. Vai ter muitas olhadas rapidas no relógio sem prestar atenção na hora. Vai ter dias ruins, vai ter dias bons. Vai ter dias ainda.
O mundo acaba todo vez que você levanta e não marca o seu dia.
Mas será que se eu voltasse a ser criança e dançasse sem musica eu seria mais feliz?

Dia 1914

Tenho 29 anos de Policia Militar.
Já trabalhei, nas zonas Leste e Sul: Tatuapé, Vila Matilde, Carrão, V.Formosa, Guaianazes, São Matheus, Itaquera, Jardim Elba, Jardim Dona Sinhá, Capão Redondo, Jardim Ângela entre outros, tudo o que você vê na TV sobre violência, eu vivo de verdade a 29 anos. Sei que você não acredita, mas de violência e segurança sei muito mais do que a GLOBO, ONU e tantos "estudiosos" sobre segurança. 
Já prendi muito bandido, já salvei muitas vidas, fiz alguns partos, já tirei muitas drogas das ruas, já tomei tiros, alguns me acertaram, mas já atirei bastante... Ganhei elogios, medalhas, reconhecimento dos amigos e parentes, mas nada disso importa, pois o que vende Jornal são nossos erros. Um dia vou errar, pois sou humano, pode ser um tiro errado, uma ocorrência mal sucedida, ou um salvamento que não deu certo. Ai sim você saberá quem sou eu, mas não pelos 29 anos de bons serviços prestados a população paulista, mas sim por um erro de fração de segundos.
Parabéns pra você professor, que nunca corrigiu uma questão errada. Pra você mecânico, que nunca condenou a peça errada. Pra você médico, que nunca deu diagnóstico errado. Pra você jornalista, que nunca errou uma palavra ao vivo. Pra você Dr. ADVOGADO que nunca mentiu para seu cliente. Parabéns a todos vocês, pois vocês têm sorte de terem várias chances... 
Pois aqui no meu trabalho sou capaz de entrar no inferno, por uma pessoa que não seria capaz de nem um copo de água me oferecer,
sou super treinado, ganho uma fortuna, não tenho stress, sobra tempo pra estar com a família, como e durmo bem todos os dias, minhas condições de trabalho são perfeitas, o povo da comunidade me adora, então por todos esses motivos não posso errar.
Boa noite!

2014/07/12

Dia 1913


Antes eu ficava pensando em que tipo de bar eu ia no sábado a noite. Essa era a minha maior duvida em questão. Agora, é diferente. Fico me vendo na frente da prateleira de fraldas tentando descobrir qual levar. Me perguntando qual delas é a mais adequada. Que tipo de papinha é a melhor. Quem me ve ali parado deve achar muito patética aquela cena. Um homem barbado que nem sabe comprar fraldas.
Certa vez uma amiga me disse que sempre que eu escrevia ela projetava a cena em questão. A imagem, as coisas, até os sons que eu descrevo. Então vamos lá, vamos dar um passeio...
Faz frio. São 15° graus na rua. As calçadas das ruas estão úmidas e de hora em hora vem uma garoa fina. Tipica e bem Paulistana isso. As pessoas tiraram suas jaquetas, casacos e sobretudo do guarda roupa. Estão mais elegantes - as pessoas sempre ficam mais elegantes no frio. As mulheres desfilam de botas altas. O ar tem aroma de grama molhada e há flores espalhadas no chão decorrido da neblina e vento da madrugada gelada. E aqui estou eu. Sentado dentro de um vagão de metro dividindo o espaço comunitário esperando que ninguém note a minha presença escrevendo em um bloco de papel para repassar isso adiante. A cada parada uma voz na interlocução do vagão anuncia qual é a próxima estação. Uso um gorro para proteger as orelhas de ficarem congeladas e o preto básico que esquenta bastante. O vagão aqui é extenso e da pra ver de uma ponta a outra. São exatamente 10:55 AM de uma sexta feira chuvosa.
Eu fico me perguntando e se você me encontrasse? O que diria? O que faria? Não seria tão patético tanto quanto eu na frente da prateleira de fraldas?
É poetizador ficar parado aqui agora, nesse banco de estação já que cheguei ao meu destino. Observar essas dezenas de pessoas que nem sabem seu nome e te ignoram mesmo assim ao passar por você. Seria meu coturno tão escuro que assusta ou a rotina cotidiana que te massacra todos os dias quando você se levanta da cama ao ponto de você nem reparar na vida em volta de você?
Pessoas, pessoas bonitas se cruzam aqui todos os dias. Mas nem se olham, nem se falam. Pois eu espero que você encontre o amor da sua vida atrás da faixa amarela. 


É uma sociedade onde cada um no seu espaço só faz presença na rede social mais forte de acordo com o sinal de wifi mais agudo. É comum e até abominável ver a maioria que espera o trem ou o ônibus ficar hipnotizado na tela touch.
Já eu, chamo a atenção porque sou o único com a cabeça baixa, porém escrevendo em um bloco de papel. Meu inseparável bloco de papel e sua companheira caneta mágica.
Então, o que você faria ao me ver? Me daria um abraço ou um beijo e diria que lê minhas linhas pela sua telinha? E depois? Seria aquele silêncio embaraçoso e desapropriado? Mas que tal um café ou me chamar para ser padrinho do seu filho? Ok, passamos por cenas patéticas todos os dias... Eu em frente a prateleira de fraldas e você me ignorando todos os dias sentado diante de você, escrevendo sobre você naquele banco de mêtro. Mas, o que realmente é importante? O que realmente vale até o final?
Se você fosse morrer hoje e pudesse fazer os ultimos pedidos, o que você pediria? Eu pediria... Sorvete de baunilha. Sim, é, sorvete de baunilha! E pediria pra ler "Paris é uma festa" de Ernest Hemingway. Pediria pra ouvir Cazuza também. E quando ele chegar naquela parte com a Bebel... 
'Quando a gente conversa
Contando casos, besteiras
Tanta coisa em comum
Deixando escapar segredos'
... Eu vou cantar com eles. Vou pedir também um beijo na boca. As pessoas esqueceram o valor de um beijo na boca. É mais importante do que o sexo consumado em si até, e se esqueceram disso. Vou riscar esse dia do calendário. Vou pedir desculpas também. Vou escrever esse texto.

Dia 1912


Voltando da balada sexta a noite no meu carro tunado. #ostentação

Dia 1911

Não tenho fãs, tenho leitores. Eu não canto nem me apresento ao vivo... Eu conto histórias.

2014/07/07

Dia 1910

Então, esse era pra ser um dia normal. Se não fosse o fato de que era o primeiro dia após eu receber a noticia.
Levantar, tomar banho, esquentar o café, calçar as botas e ir trabalhar. Mas, o que supostamente eu deveria fazer agora? Essa é a parte que eu tenho que voltar um pouco no tempo e contar o que aconteceu pra vocês entenderem.

2 meses atrás...

Esse é o reflexo do espelho que não vai mudar. É uma quarta-feira. 22 anos e alguns meses de idade, recém-admitido na Corporação do Comando Tático da Policia Civil do Estado de São Paulo. Diante do meu Comandante, faço continência e me retiro da sala com o distintivo em mãos. Ele brilha, é de latão folheado. Tem meu nome escrito e 'Detetive' em negrito debaixo dele. Ao sair da sala me encho de orgulho de ter conseguido. Lembro do dia da prova e em como eu estava nervoso. Tudo estava dependendo daquelas 4 horas de prova baseadas naquelas 60 questões. E depois, a prova física e passar pelo psicólogo. Nunca tinha ficado tão tenso quanto nessa época da minha vida. "E tudo agora vai mudar" eu pensei. E mudou, eu mal consegui identificar tantas mudanças nesse curto prazo de tempo. Uma arma e uma responsabilidade ao mesmo tempo, eram esses meus pensamentos. 

1 mês atrás...

Por mais que ela tivesse visto armas pela vida toda dela, eu não gostava de deixar minha beretta 9mm perto dela. Queria que ela estivesse em paz dentro de casa, como se la fosse seu templo e nada de mal pudesse acontecer a ela. A casa cheirava a incenso. E sempre tinha flores na varanda.
Meus horários eram alternados então ela nunca sabia que hora eu estaria em casa apesar da gente se falar o dia todo. Dia que eu tinha que cumprir mandado era difícil, ela ficava preocupada. Lembro da minha primeira batida umas semanas atrás, eu quase tomei um tiro. Rômulo disse que era meu batismo tomar um tiro na primeira vez. Ah, Rômulo é meu parceiro. Ele é meio gordo, quarentão já e tem um bigode grisalho. Usa óculos pra ler. Nem contei isso pra minha esposa, ela ia pirar. Pra ela eu era o cara que atirava primeiro - sempre. E que seja assim então.
Quando decidimos morar juntos foi meio complicado. Não sabíamos fazer funcionar sabe? Quem coloca a roupa pra lavar hoje? Quem tira a roupa do varal? Ela colocou comida pro cachorro? Deu leite pro gato? Droga, acabou os ovos. Quem devemos culpar já que ambos esquecemos disso? É um desafio e tanto sabe, juntar as escovas de dentes. Se acabou você que tem que ir la comprar, não vai aparecer uma mão mágica e trazer o que você precisa. 
Eu estava sempre limpando minha arma e ela sempre arrumando o cabelo. Eu lendo noticias e ela lendo revistas de decoração pra incrementar a casa. Noivamos logo que entrei pra Policia e logo fomos morar juntos. Ainda estou juntando uma grana pra casarmos. Mas pra mim, já somos marido e mulher. Assinar um papel é só um detalhe porque já sei que vou viver com ela pro resto da minha vida. E ela merece ter aquele casamento de princesas da Disney sabe? E eu vou dar isso pra ela.
Ja faz alguns dias e ela anda falando sobre filhos e crianças correndo pela casa. A gente da risada e ficamos tentando adivinhar que tipo de cabelo ele ou ela vai ter, se é enroladinho ou liso demais. Se vai ter os meus ou os olhos dela. Se vai puxar o meu nariz largo ou o dela arrebitadinho. Mas pensar em ter um filho no mundo atual parece até meio insano. Tem muita maldade acontecendo, ás vezes é foda pensar nisso.

1 semana atrás...

Ela me disse que se sentia enjoada e com muita dor de cabeça á alguns dias. Achei que era porque estava trabalhando demais ou porque não usava o óculos que já tinha feito mas sempre esquecia em casa. Eu disse que se continuasse levaria ao médico. Eu estava de folga, então tratei de cuidar de tudo da casa naquele dia. Depois, sentamos no sofá para assistir televisão. Ela ficou quietinha e deitou no meu peito. Acabou pegando no sono. Então, vendo-a dormir me passou um mundo de coisas na minha cabeça. Eu sempre fui um idiota sabe? Nunca consegui suprir toda a ânsia de amor que ela esperava de mim. Ultimamente as coisas tem acontecido muito rápido e nem perguntei se ela esta feliz. Dei um beijo nela enquanto ela ainda dormia, espero que ela entenda que eu estou feliz.

18 horas atrás...

Estou dentro do camburão, Rômulo cheira a cigarro barato do tipo Free ou algo pior. Temos o apoio de mais duas unidades e a Copom ta mandando mais uma que a Militar vai dar suporte. Nem avisei a ela que hoje teria batida. Na verdade, eu tinha esquecido.
Então, esse era pra ser um dia normal. Se não fosse o fato de que era o primeiro dia após eu receber a noticia. Levantar, tomar banho, esquentar o café, calçar as botas e ir trabalhar. Mas, o que supostamente eu deveria fazer agora? Ontem a noite ela me deu a noticia que estava grávida. E hoje pela primeira vez estou sentindo medo. Tudo me da medo. A sirene, o pé no acelerador, o barulho do encaixe do meu colete. Eu olhei para o meu distintivo e me deu medo. Todos os dias você sai de casa e não sabe se volta, mas e agora? Como ela fica? Será que é dessa hora que a maioria fala, que tem que mudar de profissão? 
Era um caso de homicidio, mutilação e estupro. Haviam 2 mandados para cumprir. Na verdade esse caso nem era meu, era de outro detetive mas demorou tanto pra sair o mandado de prisão dos desgraçados que eu acabei assumindo o caso porque o outro se aposentou. Eu estava nervoso, a gente nunca sabia o que ia encontrar atrás das portas. Eu pensava no meu filho. Na minha mulher. No juramento que fiz ao receber o distintivo. Pensei que poderia tomar um tiro naquele dia. Pensei que meu filho poderia nascer sem pai e minha mulher ficar viuva tão nova. 
No hangar das armas antes de irmos pra rua o chefe perguntou se eu tinha uma arma primária. E eu só mostrei a beretta. Ele riu e jogou uma calibre 12 nas minhas mãos. Ela pesa mais ou menos 3 kilos. O coice que ela dava no tranco era muito forte. "Uma coisa assim mata qualquer coisa" - pensei.
Entao fomos.
Quando chegamos lá o infeliz estava armado. Chutamos a porta anunciando que era a policia e fomos recebidos a bala. Ele disparou 5x e correu da sala para os fundos. Os tiros dele atingiram o vidro da porta espalhando estilhaço pra todo lado. Eu entrei com a 12 e disparei na parede em direção aonde ele correu, o tiro espalhou-se e os fragmentos da bala atingiram a perna dele de raspão. No fundo mais dois viciados armados começaram a atirar. Outros companheiros me deram cobertura enquanto corri pra ficar contra a outra parede. Atiraram em minha direção. Dava pra ver os pedaços de parede caindo conforme as balas penetravam o cimento e tijolos. Foi então que apontei o cano da arma pela fresta da estante e parede e disparei. Acertei um deles que acabou caindo no chão. Havia dois no fundo. Pedimos para pararem de atirar pra negociarmos mas eles nem ouviam. Gritavam palavrões e coisas que não davam pra entender direito, ainda atirando em nossa direção. O Oliveira atingiu mais um deles e tirou ele de cena. Sobrou apenas um. Ele pensou em fugir, parou de atirar e foi pro quintal dos fundos mas não havia pensado direito pois as paredes de lá eram altas demais pra pular e escapar. Um morto, outro desmaiado por causa de um balaço que atravessou ele ao meio mas ainda vivo. O que o ultimo estava pensando? Que teria super poderes de sair voando pelo quintal? Coloquei a 12 no suporte e carreguei-a no ombro e usei a beretta como arma primária. Virando a porta o desgraçado estava apontando a arma pra mim. Continuou falando um monte de besteira que era inocente etc e tal. Mas que tipo de inocente carrega uma ponto 40?
Dei voz de prisão e senti o dedo dele puxando o gatilho. "Hoje não" minha voz dentro da cabeça dizendo. Acabei atirando primeiro. Dois de 9mm no peito e ele caiu. Eu senti alivio, enjoo, tontura, medo, raiva, culpa... Tudo misturado mas me mantive á postos. "LIMPO". Perguntei ao Oliveira o que deveriamos fazer com o cara desmaiado e ele disse "Deixa sangrar até morrer". 
No relatório os mandados foram entregues. Assim como a alma desses três ao diabo. Senti vontade de chorar mas engoli o choro. Liguei pra minha mulher e disse que tinha ocorrido tudo bem. E que a amava. Conversamos um pouco e antes de desligar ela pediu que eu levasse 2 litros de leite. 
Ao voltar pra casa naquele dia eu nem precisava dizer nada e ela me abraçava. Eu não contava pra ela essas coisas mas ela sabia que o dia ali tinha sido dificil. Era sempre assim. E incrivelmente dentro dos braços dela era o melhor lugar do mundo. Mas quem diria né? De tudo que eu faço pra cuidar dela e fazê-la se sentir segura, no mundo todo dentro dos braços dela é o meu lugar mais seguro. Então me dei conta de que, pra manter a estabilidade nesse caos e pra manter minha familia com amor eu iria ter que aguentar isso mais vezes. E era isso que fazia o amor crescer, eu saber que apesar de todo mal do mundo no fim do dia eu tinha o melhor lugar pra voltar. 

Daqui 3 anos...

Eu acabei aceitando um serviço interno como promoção. Agora eu só vejo e revejo papelada e dou alguns carimbos. Ah, e puxo o saco de alguns juizes pra eu mandar meus homens mais rapido pra rua fazer o que eu fazia anos atrás. Eu sempre penso na familia deles quando eles vão. Faço preces pra todos eles voltarem inteiros pra casa no fim do dia, assim como eu. Da próxima vez que me abraçar vai sentir algo estranho na cintura. É a minha salva-vidas prateada. E por eu carregar um cano na cintura é que mantenho a paz dentro do meu lar. 

Só que ao invés de uma vir me abraçar quando eu chego em casa, são duas. Mas apenas uma eu coloco pra dormir porque a outra, dorme comigo. Todas as noites. Pra sempre!





2014/07/05

Dia 1909

Namore um cara que tem tatuagem.
Com certeza ele tem muita historia para contar. Porque fez, com quem fez, onde estava ao fazer, o que significa... E principalmente a coragem de fazê-la. Ele pode ter homenagiado os pais, os filhos, ter marcado um grande amor. Ou dito sobre versos que jamais queria esquecer. Quis marcar a pele como a alma e outros tantos significados por ai.
Uma tatuagem não é como um bilhete de geladeira como lembrete temporário. É pra vida toda. 
Namore um cara que tem tatuagem porque, ele tem paciência para o bem querer de ver todo dia algo sem precisar de uma mudança. Uma tatuagem é como uma anamnese (do grego ana, trazer de novo e mnesis, memória) onde o mesmo quer se lembrar de algo com frequência. Pois lembre-se, um desenho nunca é apenas um desenho e a coragem vem do medo. As perguntas frequentes ao escolher uma tatuagem são: Porque? O que? E onde? Assim como todas as escolhas da vida. Então, namore um cara que tem tatuagem pois o mesmo ja decidiu seu próprio caminho.
Namore um cara que tem tatuagem porque ele tende a fazer escolhas decisivas e fixas. O que esta feito, esta feito. Se for pra mudar algo, vai ter que passar por cima antes. Ele sabe o valor de um risco, de um rabisco, de um traço e principalmente dos traços que a vida lhe traz.
E por fim, namore um cara que tem tatuagem porque, porque... Porque ele não é só uma revista em quadrinhos ambulante, ele é mais que um livro ilustrado. Ele é um contador de historias. Ele é a própria historia.  

Dia 1908

É um ponto de ônibus. Faz parte da rotina. Faz parte do meu dia e de mais um monte de gente por ai. Ir para a casa e pensar que o motorista poderia não fazer tantas paradas ou pegar mais sinais verdes por ai só pra eu chegar 15, 10 minutos mais cedo em casa. Mas existe um mundo do lado de fora da janela do ônibus. A cena passa e a gente nem repara que o filme ao vivo passa e repassa 500 milhões de vezes todos os dias. Sabe, se aprende muito indo viver a vida e sair por ai. Pra onde for, mas que vá. Que seja!
Me questionei então: Porque as pessoas se juntam?
Seria para completar a existência imutavel de que todos somos sós nesse mundo desde que nascemos? Para saciar a solidão e carência de finais de semana no calendário? Para desfazer o deja-vu diário do silêncio sobre todos os acontecimentos que não foram conversados, comentados, discutidos e risos? E em toda solidão e segredos tem podres de alguém. Mas isso não deve mudar nada. 
Pessoas se juntam para aumentar a grandiosidade que existe dentro de cada um. Isso só é possivel quando já se é grande o suficiente pra entender sua própria dimensão e saber que pode ficar ainda maior com a presença mantida de outro alguém ali do lado de dentro. 
Então... Somos um casal!
É o amor do seculo atual. Você conhece esse alguém pela internet. Se envolve com esse mesmo alguém. Troca marcações, e risadas virtuais. Se apaixona. Encontram-se algumas vezes. Mudam-se os status de relacionamento. Aparecem fotos com marcações e declarações escritas com famosas frases de famosos autores. E pronto. Cria-se um novo casal cibernético atual que dura o que? 3 meses? 1 ano? E parece ser a coisa mais linda do mundo. 
Do encanto para cada um em seu canto. A atualização de status de relacionamento é alterada pela segunda vez. Fotos serão excluidas, marcações deixaram de existir. O botão "excluir" toma o lugar do botão "adicionar". Adicionar frase, adicionar status, adicionar frase e agora é só "excluir". Parece fácil, absolutamente facil. Um click, um toque, um enter e o sentimento se torna inefavel.
Você é destituido do cargo de "relacionamento sério".
Esta feito. 
Mas voltamos. Então... somos um casal novamente!
Somos imperfeitos, mas quer saber... Eu amo a nossa imperfeição. Talvez até sejamos o casal mais imperfeito que existe. Mas eu amo a nossa imperfeição, porque em cada detalhe dela esta um pouco de nós e do que criamos. Esta a beleza de sermos um casal - mesmo que imperfeito - mas par feito um para o outro.
Somos nós, um cachorro e mais um gato. Que seja. Que sejamos!

Dia 1907

As pessoas dizem fazer o bem mas só andam proclamando o mal. 
Se você esta saindo de casa para trabalhar e um morador de rua te pede um café o que você faz? Diz que esta saindo de casa e atrasado ou que não tem nada. Sabendo que ele não te pediu dinheiro, ela te pediu café ou um pão que seja. Você gastaria 5 minutos do seu dia para dar um café para um estranho? Valéria Piassa Polizzi escrevendo Depois Daquela Viagem disse: "Como seria o mundo se todas as pessoas começassem a gastar cinco minutos de seu tempo umas com as outras?"
Pois a mesma pessoa que passou batido pelo estranho, pagou seu dizimo na igreja. Não há lugar especifico para fazer bondade nessa porra de sociedade doente. Não precisamos proclamar religião, politica ou futebol para nos tornarmos cada vez mais individualistas em grupos socialmente aceitáveis. Porque somos individualistas SIM!
Eu, você e a cambada toda do seu trabalho. Da sua casa também. Do seu vinculo social. Todos do seu inbox, da sua conta no EBay. Poderia falar aqui por horas e horas sobre a individualização de cada um, começando por achar que você é totalmente independente e por você estar discordando do que esta lendo nesse exato momento. Quando houve a 'revolução das máscaras' na Câmara dos Deputados (projetado por Oscar Niemeyer), onde vários subiram ali e acompanhamos pela televisão eu achei que ia ser mais que aquilo com todo o respeito. Comecei a achar que as pessoas iam se unir para mudar o mundo e depois da primeira vitória o mundo dormiu novamente. Agora vejo grupos também independentes cada hora tentando ou - fingindo lutar - por causas diversas. O fato é que, ninguém da mais as mãos hoje em dia. Nem para atravessar a rua, nem para mudar o mundo.
Quando foi a ultima vez que você teve uma conversa com alguém sobre qualquer coisa sem algum interesse terciário? Quando foi a ultima vez que você pediu desculpas, com licença e disse 'muito obrigado'? Quando foi que você deu um abraço sincero pela ultima vez?
Aqui não é Auschwitz mas esta matando vários de nós. Por dentro sabe? A depressão é a epidemia do seculo XXI. Ao invés de ser uns aos outros, é um contra o outro na Terra. E quem somos nós para julgar um leão matando uma zebra no National Geographic sendo que matamos aos montes por ai toda vez que ligamos o carro, que não reciclamos o lixo e que fechamos os olhos em todos os faróis da vida. Assim como o amor, "Arbeit macht frei" amigos. 

2014/07/01

Dia 1905

Era sexta a noite. Chegamos por volta das 22:00hs. O lugar era bonito, bem animado ali em meio a Vila Madalena. Tocava Doors ao fundo. Fazia frio, São Paulo sempre faz frio ou então aqueles calores insuportaveis. Cadeiras de madeira, luzes que parecem ser de neon perto do teto em um vão no gesso refletindo nas garrafas da prateleira. Jack Daniels, Jose Cuervo, Stolichnaya, Johnnie Walker faziam parte do show. Um contraste legal para a decoração. Um pouco cheio, mas que lugar não é cheio as sextas á noite?
Sem cervejas hoje, a loira não gostava do cheiro nem tão pouco do gosto nos lábios quando me beijava. Eu usava botas, jeans e preto. Ela couro, jeans e uma sapatilha que parecia de bailarina. Ela longos cabelos, eu cabeça raspada e barba. Ali eu sabia dos riscos e não queria nenhum otário olhando pra minha garota. Não porque era minha, mas ela é linda. E eu gosto de ser o cão de guarda dela sabe? Proteger ela, cuidar dela e não deixar nenhum zé-mané com papinho furado chegar perto. Era sempre assim quando a gente saia pra lugares cheios, eu franzia a testa tentando intimidar e ela me fazia sorrir. Dai não tinha cara de mal que desse pra se segurar.
Eu me levantei por 5 minutos e quase me digladiei com uma fila de pessoas á minha frente para chegar ao banheiro. Aquele cheiro forte de urina masculina. As pias molhadas. Cenas eróticas rabiscadas nas paredes dos mictórios. E novidade, sem papel! Depois de urinar e lavar as mãos, olhando rápido para o reflexo do espelho reluzindo pela lampada amarela atrás de mim sombreando meu rosto, abro a porta e aquele mar de gente na minha frente.
Mas de ombradas e trancos eu volto á mesa e me deparo com a unica cena que odeio ver. Um cara dando em cima da minha garota. Sabe, eu já não costumo ser muito educado e cordial e ainda mais agora. Dava pra ver de longe que ela estava acompanhada. E ela não era do tipo que fazia por onde virem até ela, mas chamava atenção porque era linda. Droga, ela é linda demais e eu tenho que cuidar dela. Quando olhei pro rosto dela, vi a cara dela meio de tédio e meio com receio que eu fosse brigar com ela pelo acontecido. Mas calma querida, eu sei o que aconteceu. O idiota ali queria alimentar o ego masculino dele, dando em cima de uma mulher acompanhada (e muito bem acompanhada) tentando leva-la consigo embora como se aquilo fosse uma disputa e ele teria que ser o vencedor. Mas hoje não! E nao com a minha garota!
Eu empurrei a cadeira a minha frente e logo fui perguntando o que estava acontecendo. O desgraçado olhou ironico pra mim e disse pra eu sair dali que agora ele estava ocupado conversando com uma linda garota. Será que o imbecil não viu que aquela era a minha garota? Eu logo peguei e idiota pelo colarinho e levantei ele 3 centimetros do chão e o empurrei pra frente. A cadeira que ele estava sentado caiu. Ele me olhou assustado e minha loira mais ainda. Jamais me veria daquele jeito antes. Apesar do susto que dei nele, o panaca continuou grunhindo algo que eu não entendia. As pessoas em volta não perceberam direito que aquilo era uma discussão pois eram muitas conversas paralelas no lugar. Um barulho a mais ou a menos ali... Eu peguei a cadeira no chão e me sentei novamente, furioso da vida. Mas achei que o babaca tinha entendido o recado.
Alguns minutos depois eu sinto um vento atrás de mim e vejo pelo reflexo do copo em cima da mesa alguém me atacando por trás. Eu levanto rapido e consigo desviar. O cara veio de novo e eu levantei o braço. Ele veio com uma garrafa para quebrar na minha cabeça e eu coloquei o cotovelo na frente. Puxei ele pela camisa e bati com a cabeça no nariz dele. Quando vi o sangue achei que era meu, mas não. Acho que ele vai precisar de gelo agora. Caiu desacordado derrubando as cadeiras e outros dois caras vieram ajuda-lo. Logo aquele pedaço se encheu de gente querendo ver o que tinha acontecido e porque as cadeiras estavam no chão junto com aquele otário.
Minha menina estava assustada, querendo ir embora mas ficou ali. Sabia que não tinha lugar mais seguro do que atrás de mim. Sabia que eu não ia deixar nada de ruim acontecer com ela e que ninguém ia tocar em nenhum fio do cabelo dela se eu estivesse por perto. Porque era assim mesmo eu era o pai dela, o guarda-costas particular, o melhor amigo, o marido, o amante... Nada ia acontecer com a minha pequena se eu estivesse ali. Por isso era muito importante e imprescindível que eu estivesse sempre ali e ela perto de mim. Acho que seria a unica coisa que eu jamais me perdoaria, seria se algo acontecesse com as pessoas que eu amo e eu, de alguma forma estivesse impotente de fazer algo. Ok, é verdade, seus pais te protegem a o que? 19, 20 anos? Mas á partir do momento que me prontifiquei, a responsabilidade é minha. Minha!
Tiraram o cara de lá, não faço idéia pra onde levaram ele. Eu tomei mais alguns drinks e acalmei minha garota. Logo quis ir embora de la. Aquele manézão tinha estragado meu passeio. Quando saimos do bar eu peguei as chaves da moto do bolso. A minha mão sempre de mãos dadas com ela. 
No estacionamento, perto de um Honda prata saiu um cara vestindo roupas escuras. Eram quase 2:00 AM. Vi algo brilhoso entre o bolso da jaqueta dele e o carro. Eu nem percebi quando aconteceu mas me acertaram pelas costas. Era um outro cara escondido... Eram 3 caras. Tinha um outro que apareceu. Eu cai, mas consegui sacar a arma. Efetuei 3 disparos. Acertei um deles. Os outros correram. Minha garota ficou assustada com o barulho dos tiros. Deitado no chão senti as mãos molhadas, achei que era o sangue do outro cara. Ja viu sangue a luz da lua? É bem preto!
Mas não era dele, era meu. E sabe aquela história de que passa um filme na sua cabeça quando você ta indo? Então, é bem isso. Dai... eu dormi. Eu lembrei de quando a conheci, a garota mais nervosa que ja tinha visto. Quando nos encontramos a primeira vez ela nao parava de tremer. Eu era o bad boy tatuado e ela a garotinha acostumada com a rotina e a repetição diária familiar de se manter dentro de casa - segura. Eu era do mundo e ela uma garota de apartamento. Ela tinha um riso inconfundivel e eu um universo inteiro pra mostrar á ela. Eu queria presentar ela com liberdade sabe? Tirar os muros da familia dela. Mostrar pra ela, que ela podia ser o que quisesse ser. 
Doeu nela quando me fui. Ela chorou, amaldiçoou o destino e chegou a odiar o dia que me conheceu. Mas foi forçada a aceitar. E quando se acostumou, mesmo assim ainda se pega chorando no banheiro lembrando de uma risada, de uma marca escondida ou do ultimo beijo. "E nem tivemos como nos despedir" - ela diz.
Tem certas coisas que não se pode fazer nada, elas só... Acontecem. Eu cuidei dela até o ultimo momento. Em todas as vezes que eu brigava com ela, pra guardar o celular e prestar atenção na rua. Pra ela comer ou pra ir dormir cedo. Talvez eu só quisesse o bem dela entende? Mais do que o meu próprio. 
Pequena, comprimente o cobrador. Tire os sapatos antes de entrar em casa. Levante-se da cama de manhã querendo mesmo levantar. Boa noite. Durma bem. Qualquer coisa estou aqui... Agora protegendo você dos pesadelos.

Eu te amo
Você estava pronto
A dor é forte e insiste em aumentar
Mas eu verei você
Quando me for permitido
Sua dor se foi, suas mãos desamarradas
Tão longe