2014/05/11

Dia 1839

Não faz muito tempo eu estava sentado em uma mesa de bar. Sozinho. O celular sobre a mesa, sem muito interesse em saber das mensagens que me enviaram ou das fotos que postaram. Na verdade, não tinha interesse nenhum. Ok, na realidade ele estava desligado. Quantas pessoas você conhece que desliga seu próprio celular?
Ninguém sabia onde eu estava, afinal também ninguém questionava. Só eu. Eu e um copo de conhaque pra me deixar aquecido. Nenhuma mulher ali pra mais tarde sentar no meu colo e aproveitarmos a noite. Nenhum amigo contanto suas dificuldades financeiras ou aventuras sexuais pra eu escutar e fingir que vou consola-lo ou que me importo quando na verdade, não me importo nenhum pouco. Eu, uma mesa com guardanapos e um copo, um celular desligado. 
Eu gostava de lá, não era um ambiente de bebados barbudos moribundos. Era apenas um bar. As luzes não tão fortes. As garrafas nas estantes com luzes de neon atras. Quadros antigos da coca-cola e outras figuras vintage na parede. Madeira polida. Detalhes em vermelho na decoração.
De um lado do bar um grupo de rapazes conversando sobre futebol, mulheres e trabalho. Do outro, umas mesas de distancia um grupo de mulheres oscilando entre falar de sapatos, falar mal das pessoas que trabalham e consolar uma delas por um fim de namoro. Na mesa deles, cerveja. Na delas, uma diversidade de batidas. Consigo ver daqui, uma Vanilla Ice, Sex on the beach... Aquilo é uma caipirinha com pêssego? Uma delas é mais bruta comparada as outras que parecem ser mais delicadas, também toma uma cerveja daquelas long neck heineken. Batons nos copos, essa é a lei. Uma movimentação maior na mesa deles, chegou a rodada de tequila, sal e limão para misturar junto a cerveja e vomitar na calçada mais tarde. 
Há uma garota sentada quase no meio perto do bar, ela é bonita. Tem cabelos escuros compridos mas os prendeu para trás, olhos timidos. Usa uma blusa manga longa preta e um jeans azul. Sapato sem salto. Batom leve, só pra dar uma cor aos lábios. Mãos retraidas, acho que ela é bem timida mesmo. Pés pra dentro da cadeira. Lê algo em um pequeno livro. Acho que é uma agenda. Ela também usa oculos uma armação escura, daqui parece preto mas pode ser vinho também. Eu pensei em ir la falar com ela. Conhecer a historia dela. Saber porque ela esta ali. Mas nem cheguei a levantar da minha cadeira de madeira escura. Então continuei olhando pra todo mundo. Essa garota, dos olhos timidos... Ela me observou uma ou duas vezes. Fiquei curioso pra saber o que ela estava pensando.
Mais ao fundo havia um casal de namorados. Ele tinha um corte de cabelo maneiro. Ela usava tiara e vestido daqueles que param no joelho. Ele? Camisa e tênis. Ficou bacana. Ele estava sentado na frente dela, ela ria sem graça. Eles davam as mãos enquanto conversavam. Na minha cabeça fiquei imaginando o dialogo. Ri sozinho imitando aquelas voizinhas.
Pra atender tinham duas mulheres. Uma delas passava várias vezes por mim ja que eu havia escolhido um lugar longe de todo mundo pra poder ver melhor todo o ambiente. Consequentemente esse lugar era perto também da entrada do balcão onde elas entravam e saiam com os drinks e as garrafas. Ela me pareceu um pouco cansada e a franja que ela colocara atras da orelha ja tinha saido. Tinha uma pinta perto do labio dela. Achei bonitinho. Infelizmente não eram nem 23hs e ela ja estava cansada. Fiquei imaginando que vida fodida ela não deve ter. Aposto que é mãe solteira de um babaca que abandonou ela. E trabalha ali pra pagar as contas enquanto a mãe cuida do filho. Mas sabe aquelas garotas que ficam bonitas só por usar uma camiseta branca e jeans?  
Começou a tocar The Quaker City Night Hawks - Some of Adam's Blues e fiquei para ouvi-la até o fim. Pedi a conta. Deixei uma gorjeta para a garota da pinta. Peguei meu celular e tirei as chaves da moto do bolso fazendo aquele barulho. Olhei para todos ali novamente e não encontrei a garota de olhos timidos. 
Minha motocicleta estava estacionada em frente ao bar. E adivinha quem estava sentada nela me esperando? De cabelos soltos ela não parecia mais tão timida assim. Eu parei por dois instantes tentando imaginar uma pergunta que não parecesse idiota. 

- Sabe pra onde eu estou indo agora?
- Não.
- Não quer saber?
- Também não.
- Ponha o capacete então.

Eu girei a chave. Ela me abraçou. Cara, eu podia sentir o perfume dela invadir as partículas da minha jaqueta. Sentia a respiração dela no meu pescoço. Aquele ar quente vindo dos pulmões dela me arrepiando. 
Então fomos. Só fomos. Sem destino. Só ir. Sem olhar pra trás. E de repente ali era o meu lugar certo.


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