2009/10/03

Dia 65

O modo como somos ás vezes diz como fomos. Os lugares que frequentamos ou as pessoas com quem convivemos diz também muito sobre nós.
Eu acordo cedo e vou pra rua, logo vejo alguns velhinhos que já estão até cansados de tanto viver e que hoje precisam da ajuda de uma bengala para suportar o peso de tantas coisas vividas. Ouço os passarinhos nas árvores da rua de cima cantando alto. E conforme mais passos eu dou, chego a ruas que me lembram a infância.
Quando eu esperava ansiosamente o final de semana aparecer ou algum feriado só para poder brincar na rua. Empinar pipa com papai, me ensinando como colocar papel, cola e vareta para voar. Me ensinando como fazer rabiola para que voasse. Me ensinando nós para fazer na linha. Ou então jogar futebol na parede pintada daquela rua sem saída. Parecia que a cada chute que ele dava eu tinha que me esforçar ao máximo para agarrar a bola, para deixá-lo orgulhoso.
Podíamos cavar buraco no chão para jogar bolinha de gude ou apenas sentar e conversar.
Ás vezes, os garotos e eu subíamos a rua e desciamos a toda velocidade nos nossos carrinhos. Papai fez o meu, mas não me lembro de ter ganhado nenhuma corrida. Lembro também das voltas de bicicleta pela descida da rua, mas eu nunca podia virar a esquina e sumir das vistas dele, senão, um assobio enorme me chamava de volta. E eu, como toda criança tinha uma curiosidade saúdavel. "O que teria depois da esquina?" "O que aconteceria se eu subisse duas ou três ruas?"...
Alguns dias eu ficava tanto tempo brincando, que nem me lembrava que tinha que voltar para almoçar e depois do almoço, contava as horas de digestão para poder voltar para a rua. Eu ficava na esperança de que papai não estivesse muito cansado para continuar ali comigo...
Eu lembro do calor do sol na minha cabeça e queimando minhas costas enquanto eu pegava uma cor correndo pro meio do mato, inventando uma brincadeira diferente. E suava... como suava! Quando voltava pra casa no final da tarde, tudo que eu queria era um banho para ficar renovado e comer a janta quentinha e depois cair na cama, por que no final de semana que vem teria mais, talvez até bem mais.
O sapato sujo de terra, as mãos com vestigios de alguma pedra ou planta que havia pego... Até nos dias de chuva eu brincava. Jogava bola enquanto a chuva me salpícava com suas gotas. Eu costumava sorrir por causa disso.
Hoje eu volto naquelas ruas e elas parecem tão menores. Não há mais terra nem folhas, tudo foi coberto por cimento cinza. Não há mais paredes desenhadas nem espaço pra jogar bola. Está tudo tão mudado, tão vazio... tão triste assim. Eu volto lá e toda minha infância volta em um grande flash, mas é uma pena... que eu não possa viver tudo de novo. Eu odeio crescer - pensava assim até Peter Pan pensava, mas só ele conseguia não o fazer!
Você tem 5 minutos pra se entregar a tristeza profunda... Curta-a, abrace-a, descarte-a e prossiga.

Nenhum comentário: